Hai-kai, Mario Quintana

"Rosa suntuosa e simples,
como podes estar tão vestida
e ao mesmo tempo inteiramente nua?"

terça-feira, 26 de junho de 2012

Tuaregue de olhos ferozes e voz macia

Sonhei que escrevia um texto, publicava e lia em voz alta. Sonhei que o texto era sobre um moço que entrevejo sob os panos nos quais ele se enrola. Seus panos sopram dúvidas em meus olhos: O moço se esconde por medo para pôr medo?
Não que eu goste de jogos (fiquei escaldada do gato-mia com a Fera), mas mistérios me fascinam e quero ver o rosto sob os panos. No fundo, sei que não deve haver rosto, que os panos são o moço e, para além deles, repousa o vazio.
Mas me iludo e olho os panos enquanto danço. Anseio o entrevisto, tendo plena consciência de que meus calafrios são reflexos da Lua Nova.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Da série: despedidas.

Hoje partiu, dormindo, minha tia-avó paterna (Iramaya Queiroz Benjamin).
Assim como quando morreu minha avó Sarah, não encontro melhor registro de minha afeição a ela do que um poema que fiz ainda criança.
Se eu for a metade da guerreira que ela foi, estou realizada.


"Como o vento e como o mar
Qual título posso dar?

Vó Maia,
Assim posso te chamar?
Bom, vou direto ao assunto:
Um lindo presente eu queria te dar,
Vó Cema, sempre com imaginação
Fez logo para você um lindo presentão,
Mas e eu, o que farei?
Comprar um presente tão logo não poderei
Então, alguém me liga:
-Maria, um versinho fiz para minha irmã e amiga.
Apareceu-me uma inspiração!
O que é melhor que um presente feito com dedicação?
Portanto estou aqui, na frente do computador,
Fazendo-te estas linhas com todo o amor


6/12/2003"

terça-feira, 5 de junho de 2012

Não é sobre o hibisco

Com saudade de mortos, vivos e mortos-vivos,
Acordei bem cedo esta manhã e, me lembrando que o dinheiro da bolsa não chegou,
Decidi almoçar em casa e voltei a dormir.

Diversas razões me levam a evocar os abandonos,
Os buracos que tento disfarçar na minha trama compacta.
(Um vídeo, um sonho, novos temores, a TPM...)

Sou jovem e forte – me convenço e convenço os outros.
Forte. É desse papel que gosto, é nele que me sinto confortável.
(Lembro-esqueço o dia todo num lusco-fusco que precisa ir para o papel
Que associei, em minha infância fantasiosa, o cachorro afogado
Com o avô que “me deixara” anos antes.

Por que essa perda ainda corrói tanto?)
Uma amiga argumentou que não posso ser tão controladora emocionalmente
Se sou tão sadicamente sincera em prosa e verso. Como é possível?

(Olhei para cima e vi um hibisco.
Imaginei a mim mesma com cabelos longos e a flor rebelde em seu vermelho
Atrás da orelha. Mas cortei os cabelos, não arranquei a flor e sigo para o trabalho.)

Quando eu enlouquecia e me mantinha sufocada,
Descobri que podia contar essas coisas para mim mesma através do papel.
Depois, passei a publicar minhas tristezas, meus amores e meus anseios
Na internet. Ninguém lia, ninguém diria nada, ninguém ligava muito
Para o que havia de mais profundo e abstrato em mim.

(Eu tinha amigos. E um sentimento de solidão total que devorava tudo)

Então escrever era abrir mão do controle secretamente
(Ninguém leria mesmo),
Brevemente, para continuar a ser forte e gentil.

Publicar era o desejo de não estar tão sozinha, tão infeliz
(“Ninguém lê porque ninguém se dá ao trabalho? Por favor, se importem!”)
E peguei o hábito, o gosto.
Tornou mais fácil sorrir e a angústia passou a transmutar-se em momentos (ridículos,
Registrados para o prazer de qualquer um).