A minha vida estava bem. Mas aí, de repente, ela não estava mais. Todos os quadros foram arrancados das paredes ao mesmo tempo e o estilhaço de seus vidros feriu meus pés.
Você esteve lá. Não constante. Não intenso. Não amor. Mas lá. E eu tinha um pouco mais de força para fazer curativos e um pouco mais de força para limpar os cacos e um pouco mais de força para colocá-los no lugar. E um pouco mais de doçura para olhar a janela e ver o sol, quando você me abraçava pela cintura e respirava meu cheiro em silêncio.
Eram muitos cacos e muito pó. Muitos esqueletos nos meus armários. O meu quarto escuro era muito escuro para você. E você era quente e eu queria que me abraçasse, quente e constante. Você não quis. E não quer.
E foi embora.
Eu já tinha alguma coisa da minha força de volta. Tinha vontade de ter vontade. E achei outras coisas para além de você. Só sentia saudades ao sentar numa réstia de sol e lembrar como era quente, como era bom. Como era inconstante e só.
Eu fui paciente, constante, desprendida, leal. De vez em quando pedia um pouco de você, de vez em quando lembrava-lhe de que lhe amava, de vez em quando... Mas veio nova tempestade e novos quadros foram arrancados. Eu sentei no chão, tremendo e ferida.
Você apareceu à janela e eu achei que vinha me ajudar novamente. Não precisava me abraçar, nem ser constante, nem ser intenso, nem ser amor. Só precisava tirar uns cacos cravados que me feriam, eu pensava. Mas você só apareceu à janela e falou de sol, me falou para limpar tudo de novo. E foi embora.
Tive raiva. Tive medo. Tive saudade. Fui dura. Fomos duros. Fiquei só. Pensando bem, na maior parte do tempo estive só. Você esteve comigo, mas por tão breve, por tão pouco. Se eu não estivesse cortada, só, com medo, talvez eu não quisesse tanto seu abrigo. Mas quis. Acho que ainda quero.
Fechei a janela. Com raiva. Com medo. Com despeito. E pensei: "Sozinha. Sozinha. Sozinha.". E pensei: "Nunca mais,"
Você voltou. Pelo tempo de uma lufada de ar que levanta a saia. Pelo tempo de uma flor que murcha. Pelo tempo de um corte que sangra. Pelo seu tempo. Sempre curto. Sempre só isso. Só.
E eu percebi que, quando você voltava, eu deitava sobre cacos para que você deitasse sobre mim. Eu deitava sobre o frio para estar sob o seu calor. Quando você estava, eu estava só.
O que eu faço agora?
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